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Emiliano Martínez / Vice-Presidente da Fundação Santillana: “Editar é fascinante”
O Liber homenageia toda sua trajetória pela “sua vocação corporativa e gremial”.
Madrid
/ 16 de outubro 2017
 

Emiliano Martínez, desde jovem, é editor, porém sua carreira e vocação não deveria ser essa. Jesús Polanco, um dos fundadores da Santillana, com sua equipe, em 1964, encomendou a Emiliano a preparação de “uns livrinhos” e este, enquanto os preparava, teve esta iluminação: “Editar é fascinante”. Emiliano já fez praticamente de tudo na Santillana, até Diretor Executivo das duas áreas básicas da Fundação Santillana, a educacional e a literária, sendo agora seu Vice-Presidente. Por tudo isso, a Liber presta-lhe uma homenagem. A seguir, ele nos conta como se iniciou no ofício.

Pergunta: A seu ver, por que estão lhe prestando essa homenagem?

Resposta: É um reconhecimento dado a pessoas veteranas, que normalmente já encerraram as páginas de seu diário. Também é uma menção de afirmação ao ofício. A tarefa de um editor é coordenar a cadeia de criação, materialização e difusão do livro. Assim nasceu esse tipo de homenagem, de cuja criação eu mesmo participei há muitos anos. E agora, veja, sou eu o homenageado.

Emiliano Martínez, em Madri. CARLOS ROSILLO 

P. A origem de seu trabalho o relaciona com a América, e essa é a metáfora da Liber. A Administração pública tem cumprido seu papel apoiando esse objetivo do concurso?

R. Os poderes públicos devem ter sensibilidade por esses valores simbólicos, e uma comunidade cultural como a que nos une pela língua tem que ser um território a cultivar. Tem havido atenção, sim, com os altos e baixos próprios do jogo das Administrações Públicas. Mas é necessário potencializar o desenvolvimento da Liber, para que possa ter um peso cultural maior.

P. O senhor representa a ideia lançada por Polanco ao liderar a Santillana: A América era o objetivo.

R. Isso mesmo. Inicialmente eu trabalhei com ele em questões relacionadas à educação. Um dia, uns 50 anos atrás, ele me enviou a Buenos Aires para ajudar na versão argentina de uns livrinhos para a educação de adultos nos quais eu tinha trabalhado. Aquilo me interessou de tal forma que, quando retornei, comecei a considerar que esse era meu ofício. Editar é fascinante! Naquele caso, devíamos abordar de uma só vez as necessidades argentinas e espanholas, e essa brincadeira foi resolvida de forma natural. Foi fascinante. Com o passar do tempo, Polanco me deu um roteiro de trabalho com questões a serem resolvidas sobre os selos de edição geral e literária que a Santillana começou a desenvolver: Alfaguara, Taurus, Aguilar… Era necessário criar um grupo editorial e levar esses selos para América. Essa tarefa durou 10 anos e vingou, graças ao incentivo de Isabel, a filha dele, que levou esse grupo de editoras a ter uma presença global.

P. Então o que o senhor recebe é um Prêmio por essa vocação?

R. Sim, algo que Polanco incentivou com sua paixão profissional pela edição e sua visão de valorização da América. Francisco Pérez González, Pancho, outro grande professor, contribuiu com a visão institucional dos editores espanhóis. Foi ele quem iniciou a Liber e a definiu como o local de encontro com os colegas americanos quando estes vieram a Madri ou a Barcelona para participar da Feira de Frankfurt.

P. Nesse período de seu trabalho surgiu, há 30 anos, a Feira Internacional do Livro (FIL) em Guadalajara (México). Na qualidade de editor espanhol, promotor da Liber, o senhor sente ciúmes desse concurso já tão consolidado?

R. Com certeza! Desde o início da FIL, nosso grupo, justamente por causa de nossa vocação pan-hispânica, colaborou muito com esse concurso cujo líder é Raúl Padilla. Ele reclamava do pouco apoio que inicialmente recebeu por parte da indústria editorial de lá, e nós dizíamos a nossos colegas que aquela seria uma plataforma magnífica. E foi mesmo. A FIL é a prolongação natural da visão de um editor: alcançar novos leitores, criar um ecossistema cultural rico. Para fazer isso acontecer, é preciso parceria e cumplicidade, trabalhar com outros, convencer os poderes públicos da importância cultural e social dos livros. Em épocas de crise, esse discurso é interrompido: é como um vento gelado que arrasa uma safra inteira ou a reduz. Os editores mais comprometidos, com mais visão, devem aproveitar oportunidades como a FIL.

P. Como a Liber deveria avançar para completar, pelo menos parcialmente, essa trajetória já percorrida pela FIL?

R. Deve manter suas marcas de identidade e expandir o trabalho realizado, independentemente de ter que empreender outras ações. Por exemplo, as atividades de comércio exterior da Espanha, que já possibilitaram a vinda aqui de bibliotecários norte-americanos, iniciativa que a FIL também seguiu. E aqui deveria ser feita uma coisa que é uma maravilha lá: enxurradas de jovens leitores encontrando-se com autores cujos livros esses jovens possam conhecer e comprar.

P. Numa edição da Feira de Frankfurt em meados da década de noventa foi declarada a morte iminente do livro impresso, em papel, porém ele continua vivo. O que mantém essa vitalidade?

R. Umberto Eco disse que, assim como as tesouras ou as bicicletas, o livro, enquanto objeto, foi uma invenção perfeita desde o princípio. É fácil de manusear e sua leitura é fisicamente cômoda. O professor Francisco Rico diz que a tela de um dispositivo digital produz “uma leitura aos trancos”. No livro de papel, a leitura feita é a que o autor traçou. Por tudo isso a profecia não se cumpriu, permanecendo o livro em especial como um sinônimo de qualidade na leitura.

P. O senhor foi Diretor Executivo da Santillana e juntou as áreas educacional e geral. Como as combinou?

R. Nasci como editor no contato com a área educacional. Aquilo era a minha praia. Na gestão da edição cultural, eu tinha que levar muito em conta a autonomia dos editores, e eles, a obrigação de olhar para a América como objetivo da empresa. Respeitar o editor significava respeitar os autores que ele escolhesse.

elpais.com 4 OCT 2017https://elpais.com/cultura/2017/10/03/actualidad/1507039911_277306.html